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Reflexões sobre o tempo e a saudade

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Por Silvio Cadena

Chagall - O tempo é um rio sem margens (1930-39)

Quem é o tempo?

Ou o que é o tempo?

Será esse ser mais uma de nossas criações? O inventamos?

O que é, já não é mais. O segundo já nasce velho.

Podemos não ter tantas certezas sobre o que viria a ser o tempo, mas certamente o sentimos na pele, como relata Cecília Meireles em Retrato, “em que espelho ficou perdida a minha face?".

A forma como o compreendemos e como lhe damos sentidos se dá de maneiras variadas.

Os Sumérios, a mais de oito mil anos, dividiram o tempo em meses, anos etc.


Os gregos antigos criaram a figura mitológica de Cronos, oriundo do Céu e da Terra. Era o grande Deus do tempo, o tempo inexpugnável que rege os destinos e a tudo devora... inclusive, a seus filhos.

Os físicos contemporâneos, como Einstein, entendem o tempo como mais uma das dimensões. O tempo é visto como um lugar. Tanto é que nunca se dissocia TEMPO/ESPAÇO. Segundo eles, não haveria assim distinção entre presente, passado e futuro, só um rio seguindo, nós estaríamos nele, sendo levados, inevitavelmente, para morte.


Essa ideia do tempo como um espaço, me fez recordar do quadro de Chagall, pintado entre 1930 e 1939, “O tempo, um rio sem margens”. O que seria esse peixe alado? A minha interpretação pessoal não está dissociada do momento em que estamos passando. O símbolo escolhido para representar nossa turma foi esse peixe. Nós seríamos ele e nossas asas construídas ao longo de nossos anos no curso de História. As plumas que a constituem são a bagagem acadêmica e, sobretudo, nossas experiências afetivas e a sensibilidade para com o outro. Mas do que nos serviria este par de asas? Tendo o Historiador seu objeto o homem no tempo, como falava Bloch, essas asas nos possibilitam sair da imersão de nosso dia a dia e sobrevoar esse rio chamado tempo, vislumbrando assim outras temporalidades, utilizando sua sensibilidade para que possamos tirar algum aprendizado e desnaturalizar a tempestade chamada progresso, a qual o anjo da história pretende se livrar.

No curso desse rio, nos apegamos as pessoas que amamos e, por consequência, as lembranças e as saudades surgem.


Mas o que seria a saudade? Ou o quem seria a saudade?

Seria ela uma filha rebelde e desobediente de Cronos com Mnemosine (deusa da memória) e irmã de Clio (musa da História)?

Sua insistência seria uma grande resistência ao senhor seu pai, assim como resistimos ao tempo e mantemos vivo aquilo que amamos.


Falam que só a língua portuguesa que seria detentora deste vocábulo... Mas, certamente, não do seu sentido. Acredito que a mistura de sentimentos por ela carregada, como perda, falta, distância e amor me parecem bastante universais.

Outro ao dia ao conversar com minha mãe, estávamos lembrando de tantas pessoas queridas que se foram e esse sentimento de saudade que, de alguma forma, as trazem de volta. Ela me fala que seu tio, Raul Valença, um dos irmãos compositores que moraram aqui, afirmava que, a partir de certo momento da vida, vivemos de saudade...


É, amigos e amigas... é tempo/espaço de saudades...

Então, como entrar em acordo com o Compositor de destinos e Tambor de todos os ritmos?! Ao invés de partir para um discurso de monetarização do tempo como “tempo é dinheiro” ou “invista seu tempo em coisas uteis”, recitarei o poema Tempo, de Mário Quintana.


“A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.

Quando se vê, já são seis horas!

Quando se vê, já é sexta-feira!

Quando se vê, já é natal…

Quando se vê, já terminou o ano…

Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida.

Quando se vê, passaram 50 anos!

Agora é tarde demais para ser reprovado…

Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.

Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas…

Seguraria o amor que está a minha frente e diria que eu o amo…

E tem mais: não deixe de fazer algo de que gosta devido à falta de tempo.

Não deixe de ter pessoas ao seu lado por puro medo de ser feliz.

A única falta que terá será a desse tempo que, infelizmente, nunca mais voltará.”


Estou certo, amigos e amigas, que vivemos de uma forma linda e intensa cada momento em que estivemos juntos no caudaloso rio chamado TEMPO.



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Sílvio Cadena é doido pela vida e pelas brisas ordinárias. Professor de História da rede Pública de Pernambuco e um curioso plástico nas poucas horas vagas. Graduação e Mestrado pela Ruralinda, UFRPE.

 
 
 

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