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  • cleverfernandes196

RAÇA HUMANA – GILBERTO GIL

Gilberto Gil, um dos maiores cantores da MPB, dispensa apresentação, poeta, compositor, ativista da cultura. Este ano estamos completando os trinta e cinco anos do seu álbum Raça Humana. Esta produção emblemática, merece uma lembrança especial, pelo conjunto das músicas apresentadas pelo grande Gil. No Brasil, o ano de 1984 marcado pela explosão da onda do Rock Nacional, este medalhão da MPB lança uma obra prima. Este é um dos mais importantes álbuns daquele ano. Gil mostrou que aos 42 anos podia se reinventar, presentando para os seus fãs, rock, blues, reggae, músicas de alto nível, poesias de rara beleza e com pitadas de sensualidade incrível. Das composições imortais temos a Vamos Fugir, regravada vinte anos depois do seu lançamento pela banda Skank; Pessoa Nefasta, Índigo Blue e Tempo Rei são os principais sucessos deste lindo e encantador álbum. São quarenta e um minutos de pura magia. As composições nos fazem movimentar numa viagem mental magnifica. Vamos “gilbertiar” entrando em algumas estações: Primeira estação: A RAÇA HUMANA, dá nome ao álbum e nos remete à obra da criação. A raça humana é uma semana trabalho de Deus… O realismo poético nos revela as contradições e a paradoxal condição humana dizendo: “é ferida acessa, uma beleza, uma podridão, o fogo eterno e a morte, a morte e a ressurreição”. Gil ainda canta a beleza da raça humana na produção da arte. “A raça humana risca, rabisca, pinta, a tinta à lápis, carvão ou giz”, na saudade do paraíso perdido por Adão, carregamos o desejo do retorno ao oásis de Deus. Segunda estação: O TEMPO REI é a expressão da temporalidade humana. É uma oração de reconhecimento que precisamos de paciência para viver. Gilbertianamente ele canta:

“Tempo rei, ó tempo rei, ó tempo rei Transformai as velhas formas do viver Ensinai-me, ó Pai, o que eu ainda não sei Mãe Senhora do Perpétuo socorrei

Mães zelosas, pais corujas Vejam como as águas de repente ficam sujas Não se iludam, não me iludo Tudo agora mesmo pode estar por um segundo”

Somos criaturas temporais, vivemos num determinado tempo e por pouco tempo. Somos seres históricos. O tempo define tudo, “Água mole, pedra dura Tanto bate que não restará nem pensamento”, por isso transforma as velhas formas de viver em novas. O tempo nos faz sempre novos. O problema são os preconceitos cristalizados, assim dessa estação do tempo Gil nos leva para preconceitos arraigados na alma de algumas almas sebosas, e depois pessoas nefastas.

Terceira estação: MÃO DA LIMPEZA a grande questão social brasileira, o racismo. Gilberto Gil nos faz pensar sobre numa bela composição.

O branco inventou que o negro Quando não suja na entrada Vai sujar na saída.

[…]

Na verdade a mão escrava Passava a vida limpando O que o branco sujava Imagina só O que o branco sujava Imagina só Eta branco sujão”.

Quarta estação: duas músicas que podemos dizer nos faz pensar a sensualidade da musicalidade do Gil. Nas letras de ÍNDIGO BLUE e VAMOS FUGIR temos uma beleza e uma sensualidade poética incríveis. A delicadeza na construção da utopia da vida a dois, como se conduzisse seus ouvintes para o paraíso pedido da criação humana. Na primeira ele escreveu a beleza do corpo feminino:

“Sob o blusão, sob a blusa Nas encostas lisas do monte do peito Dedos alegres e afoitos Se apressam em busca do [bico] do peito De onde os efeitos gozosos Das ondas de prazer se propagarão Por toda essa terra amiga Desde a serra da barriga Às grutas do coração”

Depois a presença do corpo masculino:

“Sob o blusão e a camisa Os músculos másculos dizem respeito A quem por direito carrega Essa Terra nos ombros com todo o respeito E a deposita a cada dia Num leito de nuvens suspenso no céu Tornando-se seu abrigo Seu guardião, seu amigo Seu amante fiel”

A construção poética nos remete ao casal original da tradição judaico-cristão. Na sequencia parece que o projeto não funcionou, por isso foi necessário criar uma rota de fuga. A saída é fugir. A composição Vamos Fugir continua na mesma pegada de sensualidade. Como num grito de alerta Gil canta: Vamos fugir deste lugar. Tô cansado de esperar. Na certeza que esta com a pessoa certa, como sua Eva, ele acrescenta: vamos fugir para

“Qualquer outro lugar comum Outro lugar qualquer […] Onde haja só meu corpo nu Junto ao seu corpo nu”

O retorno ao paraíso.

Recebemos um presente deste negro, baiano, poeta e músico da vida humana. Ele começa com a Raça Humana e termina no Paraíso. Gil refundando o mito da criação onde todo casal simbolicamente são Adão e Eva.

Agradeço ao colaborador e amigo, Nertan Silva-Maia, pela ilustração DE ONDE VEM A HUMANIDADE.

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