PABLO ESCOBAR NA PRODUÇÃO CINEMATOGRÁFICA
- cleverfernandes196
- 12 de out. de 2015
- 4 min de leitura
As pessoas normalmente, quando assistem uma produção cinematográfica ficcional baseada em fatos reais, tendem a acreditar que estão diante da verdade e, por isso, encaram aquela produção como a representação da verdade histórica. Os filmes ditos históricos produzem essa sensação. Mas isso é até compreensível, pois, após assistir uma narrativa coerente e bem montada, dificilmente as pessoas param para questionar sobre o grau de veracidade de tudo aquilo que assistiram. E isso acontece porque elas esquecem que produção cinematográfica é arte, e que a arte não está a serviço da verdade. Ela não é serva da verdade, a produção artística não se preocupa com a verdade, ela é criação, é imaginação possível. O cineasta é um inventor, mesmo que esta invenção esteja fundada, ou seja, baseada em fatos históricos, ela é criação ou, se quiser, recriação. O filme com pegada histórica não é uma simples representação dos fatos, além do mais, mesmo se ele quisesse realizar essa façanha, seria algo impossível de se fazer. A realidade é sempre mais complexa e múltipla do que podemos construir em nossas representações mentais, modelos ou outras coisas dos gêneros. A produção cinematográfica opera uma seleção dos acontecimentos que se tornaram cenas no filme, também é necessário criar diálogos, que possivelmente nunca aconteceram como são apresentados; outra coisa significativa é a escolha da perspectiva da e na reconstrução histórica. A pergunta que não podemos deixar de fazer: a partir de que lugar o cineasta está contado essa história? Como Nietzsche ensinou, não existem fatos, temos apenas perspectivas sobre os fatos, assim a verdade cinematográfica é uma perspectiva possível dos acontecimentos. Por isso, quando nos perguntamos: “quem foi Pablo Emilio Escobar Gaviria?” temos múltiplas respostas, ou perspectivas. Existem duas séries sobre Pablo Escobar no mercado cinematográfico à disposição dos amantes de séries ou filmes, e elas apresentam respostas parciais dessa pergunta. A primeira, produzida em 2012, intitulada Pablo Escobar: el patrón del mal, tem 74 episódios e narra a vida deste narcotraficante colombiano da infância a sua morte. A segunda, intitulada Narcos, com duas temporadas: a primeira produzida em 2015, com 10 episódios, que busca narrar a vida do Escobar até a fuga do presidio La Catedral; e a segunda, produzida em 2016, também com 10 episódios, que dá sequência a narrativa da vida de Escobar. El patrón de mal e Narcos são duas perspectivas bem diferentes sobre o mesmo homem. A primeira oferece uma visão a partir do personagem principal, a história se centraliza em Escobar, a dinâmica narrativa tenta dar um ar de veracidade em tudo que apresenta, a tentativa de dar realismo histórico é tão forte que o cineasta mesclou ficção com cenas jornalísticas. Quem está assistindo tem a sensação de uma fiel reconstrução dos fatos. Não parece que é uma peça ficcional. A força das imagens reais provoca essa sensação. Porém, mesmo a narrativa respeitando a cronologia dos fatos, o cineasta para dar sentido a história que ele está produzindo tinha que imaginar e inventar. Criar um enredo que concatenava os fatos escolhidos para serem encenados. E frente as controvérsias da vida, ele deu suas respostas a controvertida vida do Pablo Escolar. O cineasta não é um historiador tentando fundamentar sua análise justificando todas suas falas com fontes. O desenrolar da história na série tem sua dinâmica e seus interesses. Os atores mesmo representando pessoas reais não são apresentados com os seus nomes reais, foram criados os personagens com nomes fictícios, que para quem conhece um pouco da vida desse narcotraficante sabe exatamente quem é quem no tabuleiro dessa série. Bem como sabe que as montagens das cenas atende ao ritmo da história criada e não da história vivida, que tem outra ritmicidade. O ritmo da vida nunca será igual ao ritmo da produção da arte cinematográfica. A série Pablo Escobar: el patrón del mal é incrível, mas não é e nem pode ser encarado como uma reconstrução fidedigna da vida do Escobar. A outra série intitulada Narco, que tem o ator brasileiro Vagner Moura representando o Pablo Escobar, tem uma perspectiva muito peculiar. A história é desenvolvida não a partir do personagem Escobar, mas a narração se dá a partir de um agente da DAE, o super órgão antidroga dos Estados Unidos da América. É esse braço do imperialismo Yankee da luta contra o tráfico internacional de drogas que narra a história, na figura de seu agente, aqui temos uma outra versão. Essa opção já é em si falante, pois a perspectiva assumida indica e revela os valores da produção. O produto está impregnado, quer dizer, tem as marcas identitárias do produtor. Estamos frente ao olhar Yankee sobre o fenômeno complexo do narcotráfico colombiano. O que considerei interessante é que o Pablo Escobar da primeira série é muito mais violento e sanguinário do que o da visão Yankee, mas não podemos afirmar nada sobre o Pablo real, que continua uma contradição. Amado por uns e odiado por outros. Não tenha dúvida, caro leitor, ele não foi nenhuma e nem outra coisa, muito menos a média entre ambos. Quem foi Escobar? Existem várias imagens – a do filho, Juan Pablo Escobar, em recente livro de memória denominado Pablo Escobar: meu pai; ou do sicário John Jairo Velásquez, codinome Popeye, que foi braço direito do Escobar, e escreveu dois livros sobre o seu Patrão; ou dos jornais e revistas da época, ou ainda as imagens produzidas nessas séries televisivas. As imagens do maior traficante de cocaína do mundo são múltiplas e contraditórias, por isso, ele é e continuará sendo uma incógnita para todos, jamais saberemos quem de fato foi Pablo Escobar. E, não se iludam, essas séries não podem ser consideradas como expressões da verdade sobre o homem que infernizou a Colômbia no século XX, criando o narcoterrorismo.
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