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  • cleverfernandes196

VARIÁVEIS DO PRESENTE VIVIDO: CONTRAÇÃO, RETENÇÃO E EXPECTATIVA

A vida é uma soma de contrações, de retenções e de expectativas. Nosso comportamento estão associados ou animados pela e na combinação dessas três variáveis. As experiências vividas e sofridas no presente vivido nos faz contrair ações e reações. E nesse movimento de ações e reações vamos adquirindo ou contraindo habilidades na arte de viver. Assim, podemos afirmar que, as habilidades são frutos dessas contrações. Como habilidade e hábito estão na mesma raiz linguística, nos diz Deleuze, hábito tem em sua essência a contração, e a própria linguagem nos revela isso, falamos em contrair um hábito qualquer. Somos um conjunto de hábitos adquiridos nas ações cotidianas, eles são fundamentais, pois somos habilidosos apenas quando fazemos habitualmente determinadas coisas e, assim, já contraímos, incorporamos todos as ações necessárias para fazê-la com tranquilidade e maestria. Sabemos que não e nada fácil, quando temos que fazer algo que ainda não temos habilidade e, por isso, não adquirimos hábito, muitas vezes ficamos tensos, apreensivos e cautelosos, mas depois de muitas repetições vamos ganhando tranquilidade. A vida é contração de hábitos, o que nos deixa tranquilos. Além do presente vivido constituir o tempo da aquisição dos hábitos, ele também é síntese do passado e do futuro. O passado é retenção das experiências vividas e sofridas além de aparecer em nossa herança genética, “o passado da retenção aparece na hereditariedade celular”, nos diz Deleuze. Então o passado se constitui como retenção dos hábitos contraídos e, ao mesmo tempo, aparece como aquilo que carregamos como hereditariedade dos nossos genitores. O passado é retenção, e o futuro é expectativa em pelo menos duas facetas. A primeira face é menos problemática, apenas para a vida cotidiana, pois  é muito questionada na filosofia. A causalidade é um problema filosófico importante, porque é a força do hábito que produz em nossa mente algumas expectativas, que podemos chamar de principio da causalidade. Estamos habituados a relacionar coisas que aparentemente se repetem, David Hume foi um feroz crítico dessa associação mecânica. Diante da repetição das coisas criamos “quase naturalmente” uma expectativa. Numa sequência AB, AB, AB, ao ver A a expectativa é esperar B sempre. Numa relação obrigatória de causa e efeito, porém isso é fruto da expectativa, mas não necessariamente isso acontecerá. Neste caso a expectativa está apenas na combinação mental das repetições que habitualmente percebemos no mundo e na natureza. A outra faceta da expectativa é perversa, pois está relacionada aos sonhos e aos desejos da vida. E a expectativa é a mãe da decepção dos sonhos e desejos, e ela tem duas irmãs a preocupação e a ansiedade. A expectativa liga-se ao mundo da possibilidade. E, de acordo com Sören Kierkegaard, “a possibilidade é a mais pesada de todas as categorias”, pois o mundo da possibilidade produz ansiedade e preocupação. Muitos advogam que a realidade é dura e pesada, mas, na verdade, a maior dureza e peso esta na possibilidade, pois, ao contrário do que pensam os sonhadores e idealistas, a realidade é muito leve e suave, ela é o que é. Existe uma leveza fantástica na realidade quando se olha o mundo com os olhos da possibilidade, pois nela tudo é igualmente possível: vitórias e derrotas, sucessos e fracassos, o lado terrível como o agradável da vida. Porém, as pessoas no mundo encantado projetam apenas as vitórias, sucessos e felicidade quando imaginam a sua vida. Produzem delírios das expectativas sonhadas e desejadas, mas existe também no outro extremo às pessoas desencantadas com o mundo que projetam apenas derrotas, fracassos e tristezas deixaram as irmãs da expectativa sufocarem seus sonhos e desejos. Nessas duas vertentes, a realidade para elas parece sempre dura e pesada, pois estamos sempre sentindo os espectros das irmãs ansiedade e da preocupação. Para mudarmos isso, é preciso considerar sempre os dois lados da possibilidade, isto é, vitória e derrota caminham lado a lado. Não existe na vida apenas uma possibilidade de sucesso e felicidade, ela também é marcada pela possibilidade de derrota e tristeza. No mundo da possibilidade, a realidade poderá ser sempre pior, pois a derrota é como um fantasma a rondar a vida de todos. Para Kierkegaard quando se aprende na Escola da Possibilidade, mesmo quando a realidade incida gravemente, a pessoa “se lembrará de que ela [a realidade] é muito mais leve do que o teria sido a possibilidade”, e com isso conseguimos domar os devaneios das expectativas. Quando se percebe isso, a realidade torna-se mais leve e suave. As experiências habituais produzem um conjunto de padrões comportamentais, sabemos se fizermos isso acontecerá aquilo, num tipo de determinismo causal… Assim nos movimentamos num campo de uma certa segurança, porém existem sempre coisas novos que nos deixam na incerteza e temos que escolher o que seria melhor naquela situação nova, diante disso criamos expectativas e óbvio desejamos sempre acertar na escolha e, além disso, idealizamos o resultado que desejamos… nessa idealização oscilamos entre a alegria flutuante da esperança e a tristeza também flutuante do medo, entretanto, não estamos condenados nem a uma uma coisa e nem a outra, o fato é que sucesso e fracasso são constituintes da condição humana, estão no mundo da possibilidade. A leveza da vida está em encarar essa condição sem receios, sem idealizações, sem o complexo de avestruz, que diante do perigo envia a cabeça num buraco para não ver a realidade… Não nos desligamos de nossas experiências, os padrões de comportamentos que conquistamos nos ajudam a viver, mas também nos revelam que podemos e devemos experimentar coisas novas. Sabemos como é pesado escolher, podemos dizer que o peso do mundo das possibilidades encontra-se na incerteza das escolhas e no medo do fracasso, e a possibilidade do fracasso pode até nos acovardar… pois no lança naquela oscilação existencial e assim não conseguimos perceber o equilíbrio… E o equilíbrio só acontecerá quando, e somente quando, aceitarmos a realidade como ela é. A aceitação, o acolhimento da vida, o amor ao acontecimento, naquela versão nietzschiana do amor fati, só assim podemos viver a leveza da vida, seja nas vitórias seja nas derrotas, a vida seguirá sempre seu movimento, seu fluxo de transformação em transformação.

[Desenho do meu amigo NERTAN SILVA-MAIA, intitulado VARIÁVEIS DO PRESENTE VIVIDO: CONTRAÇÃO, RETENÇÃO E EXPECTATIVA]

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